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a sombra escrita da imagem

62. AOS HOMENS DE BEM

{Altair Martins]

Escritor e professor



[foto de Santiago Martins]


Estamos mais atentos ainda

aos faróis dos carros

e à neblina espessa da economia.

Pelas janelas sempre abertas,

o mundo vasculha entre nossos pelos.

É que a noite já não dorme,

e os dias cumprem suas tarefas

conforme as leis exigem.

Apesar disso, gostamos cada vez mais de mais perfumes

e da língua que se fala no cinema.

É fato: somos mais bonitos que os homens de antes.


Porque ficamos a postos

desconfiando da bancarrota do silêncio,

que no fundo é prejuízo

e solado aos grilos, às flores, ao barro.

Enquanto hoje ou amanhã

alguém aproveita nosso lixo

(nem que sejam um peixe e uma ave

nas águas distantes do Sul),

nós subjugamos o clima e a literatura

e dormimos.

Da cama, fabricamos a chuva.


Estamos armados,

e atrás dos vidros mais espessos

o mundo é difuso se visto em conjunto.

Temos tecnologia e tesão suficientes

para promover o carnaval onde haja frio e fome.

Não precisamos visitar a periferia,

nem ouvir os cantos e as manifestações de choro.

As savanas e os mangues de ontem

comemoram nossas maçãs mordidas,

e amanhã faremos o preço da carne e da madeira

rezar por nós.

Só o que vendemos é fé e esporte.


Seguimos e sempre atentos

como guardas de um rei branco

— esse rei que nunca vemos

e não envelhece.

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