a sombra escrita da imagem {Altair Martins]
13. Sob o céu de cada um

Pode ser que exista um campo pra cada um
onde a árvore de cada um
espere o dia de cada um
(quando enfim ganharemos juntos na loteria).
Lá estarão as folhas que não interessam
senão à arvore e ao chão.
Pode ser que a linha do horizonte
(essa linha de cada um)
atravesse a cintura do vereador
e da manicura,
e que cada um seja, pela metade,
melhor sujeito do que é inteiro.
Então talvez um rio corra
entre as cidades que o bebem, cada uma
fingindo que enfim sabe a diferença entre a água pura
e a sem gás.
Pode ser que exista um céu pra cada um
onde o quadrado azul de cada um
responda a um chamado.
E talvez haja um pôr-do-sol particular
onde os sujeitos mais ricos mandam lavar seus carros
e passar cera polidora
e alterar a quilometragem.
Pode ser também que cada um recolha sua nuvem
antes que a chuva faça acontecer
essa mania inútil de dilúvio.
Pode ser que a estrela distante de cada um
nos anos-luzes que nos separam
nos garanta o endereço e a independência.
E pode ser que essa estrela
apenas viva de aluguel.
Pode muito bem ser que a terra,
onde vingam os alimentos e os vermes,
seja covarde porque incapaz de vingança
contra quem a suga e nela cospe.
Mas pode ser que tudo isso
seja mesmo
matéria coletiva.
CONFIRA:
Áudio do texto narrado pelo autor Altair Martins /https://drive.google.com/file/d/1eR0wny5W6RpqcOw-KOypCUXK4sFXqBs2/view?usp=sharing