a sombra escrita da imagem
125. EPIFANIA: NO ESTÔMAGO DA ÚLTIMA FLORESTA
POR Altair Martins/ Professor e Escritor
[foto de Santiago Martins]
Não me contem, porque
é quando piso a última floresta,
e cada árvore senta sobre os meus olhos,
todas elas feitas de mãos,
e úmidas, casca de fruta
que o sol manufatura.
(Toda floresta é última).
Não me contem, mas
é quando meus ouvidos cantam,
entendendo tudo o que se desidioma,
como sopro que sopra (eu sei),
caminho que caminha (eu sei),
sussurro de respiração (bem sei).
Não me contem, e é também
quando me descubro alheio ao regulamento
que arredondou e arredonda o meu nome
conservantemente. Tenho a pele inteira
pela primeira vez,
e ela alcança os cupins e as baleias
(minha pele toda vestida de pele).
Me estou aqui, digo.
Me sou outro daquele que eu era
quando abria a geladeira
sem perceber a fome aberta,
e era como se se abrissem
as portas do supermercado.
Me sei como nunca.
(E tudo sempre amanhece
e tudo está sempre dormindo
e só o chão envelhece para o ar criança).
Sim, as plantas crescerão
mais rápido que eu,
que já me despretérito.
Mas enquanto não cobrirem minha fotografia,
sou esta coisa aqui imanente,
difícil de avistar lá de cima.
Sou este corpo que se sabe tão corpo,
que só o que faz é evitar a morte.
Não me contem que é em vão.