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a sombra escrita da imagem

67. Quando o dia enfim parar

{Altair Martins]

Escritor e professor



fOTO vALMIR mICHELON

Quando o dia enfim parar

como os automóveis e a combustão do espaço,

e tudo pedir pra ser

uma mão de tinta

numa caverna na França

ou pedra no Piauí,

aí talvez um grito liberte

aqueles homens que caçam um animal que já não existe.


Estarei ao volante

de um carro a ser pago em 36 meses,

e não haverá música

ou chuva.

A mulher da direita

não dormirá de plena vontade

com o garoto que hoje fez a barba

(ele, que nada espera de uma terça-feira).

E se sei, no íntimo, que as nuvens conversarão,

será numa língua que já não vence o barulho.


Provável

que o mundo esteja com a comida no fogo,

a cerveja na mesa,

e, no sangue, aquela pergunta incessante

— o sentido de tudo isso agora?


Quando o dia enfim parar

num instante vermelho ou tão somente mochila,

somente terno, tatuagem, sapato, fones de ouvido,

não sei se haverá tempo,

no buraco de tudo,

suficiente para olhar o pássaro no arame.


É por isso que antevejo:

cobertos de areia ou de sal

pelo turbilhão da praia distante,

restamos apenas sopro.




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