- Nova Folha Regional
a sombra escrita da imagem
25. “[...] à noite nossas pedras ficam leves”.

E no entanto a lua veio inteira
a empurrar o que resta do trabalho e do dinheiro.
De onde olho, a minha cidade se divide
– o lugar onde nasci começa a acender as luzes
e o lugar onde me nasceram mulher e filhos
já se expõe ao frio.
Sou o mesmo a observar a noite ainda pequena.
Estou sozinho com as minhas derrotas, fracassos, fiascos.
Tudo o que fiz de pior vem dos farelos e fala
e atua
e olha e pede um copo d’água
que eu bebo.
Carrego por isso, nas cordas vocais,
uma língua que achei que fosse minha
e a vontade de cantar
e pedir desculpa por uma covardia.
Mas tudo mergulha no rio
e se dispersa na correnteza.
Eu cito algo que a minha escritora preferida ainda não escreveu:
“[...] à noite nossas pedras ficam leves”.
E no entanto sou eu quem digo:
cada um que se defenda com as mãos que tiver,
com sua lembrança primordial,
com a roupa que este instante agora oferece.
Pra que lembrar
se somos férteis aos erros?
Eu digo mais:
este resto de dia que a lua oprime
é tão inteiro e belo
que não caberá no café da manhã.
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