a sombra escrita da imagem
Atualizado: 14 de jul. de 2020
Sobre a inflação dos vivos
{Altair Martins]
Do que acumulamos
estão os dentes (de leite) do presente,
essa inflação dos vivos
que ignora a História e a Astrologia
e não acredita na ferrugem.
Do que acumulamos
estão talvez as emergências fúteis
— o lucro, as capas e o concreto —
e ainda o revezamento diário dos frascos de perfume
contra as formas do lixo e do fedor.
Do que acumulamos
estão os animais de zoológico,
entre eles 3 ursos de Buenos Aires,
7 girafas de Pequim
e uma barca imigrante que não chegará a Siracusa.
Do que acumulamos
estão as roupas e as caixas de sabão em pó
e também as necessidades mais urgentes:
os robôs de filmes sobre o espaço
e as bulas pra sorrir de dia.
Do que acumulamos
eis a boca enorme que confrange os olhos
para confinar a ilha de plástico do Pacífico,
e os rios que odeiam carnaval,
e o automóvel que as plantas rasteiras ocuparam.
Do que acumulamos
de fato vem a indecência de um rosto imberbe
que não precisa de estudo
pois que classifica e fermenta e depois descarta,
a exemplo do fusca 86 que não fugiu para Cuba.
De tudo o que enfim acumulamos
lá está a arrogância de sermos maiores que os mortos,
e cobrarmos na justiça a água dos indígenas
só porque habitamos
o asfalto inaugurado ontem.
CONFIRA A LEITURA DO POEMA POR ALTAIR MARTINS: